segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Aeroporto de Narita, Toquio
Contratempos boreais

 
A minha correria para embarcar para o exterior no Galeão já é praticamente um clichê. Antes acreditava que isto sempre acontece porque meu relógio interno não funciona muito bem. Agora acredito que ele funciona com precisão helvética, para organizar todo um dia de atividades pré-viagem, culminando em uma arrumação de mala a jato e uma corrida de Uber que me deposita em frente ao balcão de check-in a poucos minutos do fechamento do vôo.

Desta vez o destino é a setentrional Sapporo, no Japão, onde fui convidado para dar algumas palestras e iniciar uma colaboração acadêmica com a Universidade de Hokkaido. Chego lá por Houston, e Tóquio. Mas não hoje...

Pousei em Tóquio já semi-macerado, 30 horas após sair do Rio. Os trâmites de entrada japoneses são relativamente rápidos, mas envolvem uma profusão de formulários e pedaços de papel que era quase dolorosa para o estado mental em que eu me encontrava. Tudo penosamente preenchido e entregue, fui até a sala de embarque esperar a minha conexão para Sapporo. Do lado de fora nevava de forma intermitente. Na televisão, uma sucessão de repórteres reiterava o óbvio sob uma nevasca ('cai muita neve neste momento', eu os imaginei dizendo), com a cara de quem devia ter ouvido os pais e se formado em odontologia.
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O terminal, durante a noite.
Funcionários da All Nippon Airways tentam remanejar os passageiros
O ônibus que nos levou até o avião já deixava marcas sobre a pista coberta de branco. Embarcamos, taxiamos e... nada. Por seis horas ouvimos do piloto pedidos de desculpa cada vez mais efusivos em inglês, chinês e japonês. Do lado de fora, a neve nunca parou de cair.

Taxiamos de volta.

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O terminal, pela manhã
Dentro do terminal, uma cena de barbárie Hobbesiana digna de The Waking Dead nos esperava - se os zumbis fossem escrupulosamente limpos e marchassem em formação, enquanto pediam desculpas por mastigar o cérebro alheio. Longas mas silenciosas filas se organizaram espontaneamente. Remarquei minha passagem para o dia seguinte (saindo de Haneda, o outro aeroporto do outro lado da cidade), e recebi da companhia aérea (ANA) um saco de dormir, agua e biscoitos. Na falta de ônibus (por falta de estradas desimpedidas), trens (pelo horário, acho) e vagas de hotel (por excesso de demanda), eu eu alguns milhares dos meus amigos mais chegados acampamos por aqui mesmo.

Encontrei um canto relativamente vazio e escuro, em um terraço sobre os balcões de check-in e ao lado da sala de fumantes. Acordei com o som de pássaros (tocando do sistema de som). O céu amanheceu azul, e uma tropa de caminhonetes dotadas de pás limpava diligentemente a neve da pista. Por razões que ainda permanecem obscuras, o terminal não havia ainda sido tomado por gangues rivais lutando pelo controle das lojas de conveniência e aterrorizando a região com seus carrinhos de bagagem envenenados. Aproveitei a colher de chá para tomar um café da manhã respeitável. Em breve passarei algumas horas atravessando Tóquio até Haneda, em um trem com mais de 30 paradas programadas. Acho que quando chegar em Sapporo, jet lag será o menor dos meus problemas...

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